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Memórias do Front: José Dequech: A serviço da Artilharia da FEB

O objetivo deste blog é resgatar, através de artigos, histórias de pessoas que se envolveram no maior conflito da História - A Segunda Guerra Mundial - e que permaneceram anônimas ao longo destes 63 anos. O passo inicial de todo artigo publicado é um item de minha coleção, sobretudo do acervo iconográfico, a qual mantenho em pesquisa e atualização. Os textos originados são inéditos bem como a pesquisa que empreendo sobre cada imagem para elucidar a participação destes indivíduos na Guerra.

quarta-feira, 5 de agosto de 2009

José Dequech: A serviço da Artilharia da FEB

Na madrugada do dia 2 para o dia 3 de dezembro de 1944 o Sargento Auxiliar José Dequech estava recolhido ao seu abrigo quando começou a ouvir os sons da batalha ecoando a distância. Pouco tempo depois um oficial percorreu seu abrigo acordando todos para que ocupassem suas posições de tiro, pois “muita gente nossa estava morrendo”.[1] Dequech prontamente atendeu a ordem e ordenou aos seus homens a tomada de posição e aguardou, pacientemente, os comandos da Central de Tiro. Aquela madrugada ficaria marcada em muitos homens integrantes da Força Expedicionária Brasileira que estavam lutando na Itália naquele gelado outono de 1944.

Dequech, natural do Paraná, era Sargento Auxiliar da Companhia de Obuses do 11º Regimento de Infantaria da FEB. Havia se incorporado a tropa ainda em 1943 quando foi convocado e se juntou ao então 3º Regimento de Artilharia Montada com sede em Curitiba. Lá aprendeu a ser um homem da artilharia e com todo orgulho entendeu o seu dever. No início de junho cabos e soldados receberam a ordem de que se deslocariam até Pindamonhangaba como parte da transferência para o Rio de Janeiro a fim de integrarem a 1ª Divisão de Infantaria Expedicionária. Dequech lembra que, naquela manhã do dia 24 de junho, enquanto marchava pela Avenida 7 de Setembro em direção a Estação Ferroviária, em Curitiba, seu irmão o acompanhava, pela calçada. Emocionado e com problemas cardíacos acabou por sentar-se na calçada e acompanhar a passagem de seu irmão ao longe. Com um lenço branco despedia-se do seu irmão de sangue que em breve engrossaria as fileiras do exército brasileiro na Itália.

O grupo permaneceu em Pindamonhangaba até 17 de julho quando foi transferido para a Vila Militar, no Rio de Janeiro. Dali a pouco foi efetuado um chamamento de homens e uma lista divulgada: nova companhia de obuses seria montada para completar o claro do 11º Regimento de Infantaria. A companhia original havia seguindo junto com o 6º Regimento de Infantaria para a Itália, em 2 de julho de 1944, quando partiu o primeiro escalão da FEB para o teatro de operações. Dequech não fazia parte da lista, mas para acompanhar um querido amigo trocou com outro sargento que havia sido designado. José Dequech estava com a passagem garantida para a Itália.

Na Artilharia cada peça ou obus é comandada por um sargento; duas peças se juntam numa seção comandada por um tenente e quatro peças formam um conjunto sob o comando de um capitão. O obus é uma arma diferente do canhão: ele dispara em trajetórias obliquas ou parabólicas e seu objetivo primordial é bombardear uma área com salvas seguidas que acabam caindo em pontos próximos. Uma bateria de obuses pode varrer uma pequena área em média a 18 km de distância. As companhias de Obuses dos regimentos de Infantaria da FEB utilizavam o obus Howitzer M3 de 105 mm que tinham alcance máximo de 6 mil metros. Quando estivesse em solo italiano, as baterias de José estariam a cerca de 3 mil metros da linha de frente.

Ao ser designado para a companhia de obuses do 11º RI, Dequech teve de aprender os maneirismos do infante. Mas isso não deixou ser orgulho de artilheiro de lado: conta que ao término dos exercícios de educação física do regimento os artilheiros entoavam a canção da artilharia pelos quatro campos do campo de treinamento de Gericinó.

Em 20 de setembro de 1944 aporta no porto do Rio de Janeiro os transportes de tropas General Mann e General Meiggs a fim de levar a Itália o 2º e o 3º escalões da Força Expedicionária Brasileira. José Dequech embarcou no General Meiggs e atravessou o Atlântico em 15 dias, aportando em Napóles em 6 de outubro de 1944. Transferidos para um campo de treinamento, estes homens permaneceram a espera de material e, posteriormente, em treinamento até o final do mês de novembro, quando receberam ordem de deslocar-se. A ordem geral de substituição ocorreu em 21 de novembro.[2]

A partir de 26 de novembro o comandante do IV Corpo de Exército decidiu empregar ofensivamente todo o 1º DIE ampliando, conseqüentemente, o setor brasileiro. O Marechal Mascarenhas de Moraes também recebeu ordens de tomar o comando global de sua divisão bem como liberdade de ação total. A Força Expedicionária Brasileira ficou responsável por um setor de 15 quilômetros, além de montar nova ofensiva para a tomada de Monte Castello – Monte della Torraccia e Castelnuovo. A data estabelecida foi 29 de novembro e o ataque seria de inteira responsabilidade da 1º DIE.

A companhia de Obuses do 11º RI teria seu batismo de fogo na noite de 28 de novembro, quando deslocou-se em direção ao Monte Castelo. Seu objetivo era dar cobertura ao ataque de 29 de novembro. De acordo com Dequech “com muita dificuldade, as nossas viaturas arrastavam os obuses pelos caminhos escarpados e lamacentos que levavam as posições nas alturas de Paroncella, de onde atiraríamos sobre o castelo. No caminho, as granadas de artilharia que iam e vinham já silibavam sobre as nossas cabeças”.[3] A madrugada foi de intenso trabalho para construir a posição de tiro.

Para o ataque foi designado um grupamento de três batalhões brasileiros ( I/1º RI, 3º/11º RI e 3º/6º RI) com apoio de três grupos de artilharia (dois brasileiros e um Norte-Americano) sob o comando do Gen. Zenóbio da Costa. Porém, as condições climáticas não favoreceram o ataque. Chovia muito e o céu encoberto não permitiu o uso de apoio aéreo. O ataque se iniciou às 7 horas. Por volta das 12 horas as tropas bateram em retirada, assoladas por 185 pesadas baixas. Durante os dias de 29 e 30 as últimas unidades do 2º e 3º escalão da FEB chegaram ao Vale do Reno.

Na noite do dia 2 de dezembro o batalhão do Major Jacy Guimarães do 11º RI deveria tomar posição em frente ao castelo. A substituição de tropas causou o que ainda hoje é conhecido como a debandada do I Batalhão. Dequech dedicou algumas páginas de suas memórias a este acontecimento até porque esteve indiretamente envolvido. Na madrugada de 3 de dezembro o sargento é acordado por oficiais ordenando que os praças tomassem posição de tiro. Havia pedidos de artilharia vindos do I batalhão comandado pelo Major Jacy. Dequech conta que uma das companhias do I Batalhão havia sido surpreendida por uma patrulha alemã e que no restante da noite as tropas foram fustigadas por artilharia e morteiros alemães, o que causou a ordem de retraimento do batalhão dada pelo Major. O acontecimento ainda está por ser desvendado: o relatório de Jacy indica que, de fato, houve combate entre alemães e brasileiros embora soldados afirmem que não existiu combate efetivo além de uma grande confusão e pânico que se instalaram na área do I Batalhão. A inexperiência de uma tropa não acostumada ao combate aliada a inexperiência dos superiores causara grande confusão na linha de combate. Inexperiência ou não, naquela noite Dequech aguardou até o amanhecer as ordens de tiro enquanto acompanhava o desenrolar dos acontecimentos que chegavam através das noticias até sua companhia.

Dequech viu a guerra de perto: presenciou a situação de pobreza do povo italiano, repartiu sua ração com civis e recebeu muita artilharia alemã na cabeça. A companhia de Obuses do 11º RI acompanhou o regimento em toda a sua estada pela Itália. Estava presente na tomada final de Monte Castelo em 21 de fevereiro de 1945 além da batalha por Montese. Dequech retorna ao Brasil em setembro de 1945, exatamente 1 ano após deixar a terra natal em direção ao Teatro de Operações da Itália.


[1] DEQUECH, José. Nos estivemos Lá. Legião Paranaense do Expedicionário: Curitiba, 1994. p. 52
[2] BRAYNER, Marechal Floriano de Lima. A verdade sobre a FEB. Civilização Brasileira: Rio de Janeiro, 1968 p. 237
[3] DEQUECH, op. cit. p. 48

7 comentários:

Paula Mello disse...

Olá Fernada! Que história, hein? Incrível o que os brasileiros têm de amor para dar, mesmo em tempos difíceis. Pena que a maioria das pessoas não saibam.
Uma semana iluminada!
Paula

Anônimo disse...

adorei seu blog, sou militar e perto da minha casa tem um museu da FEB mantida por um ex-combatente, cujo nome de guerra não me recordo no momento, mais que conto pra nós do batalhão varias historias
se quiser, eu posso passa o contato dele, meu email é dartagnanvalarini@hotmail.com
tenho certeza que ele adoraria contar suas hoistorias pra alguem que ama historia, e o exercito brasileiro
tenha uma otima semana

Ingrid disse...

Fernanda!!!!
Adorei seu blog, principalmente que você falou sobre o meu pai...José Dequech ,exemplo de cidadania,responsebilidade e honestidade.Parabéns por esta oportunidade de mostrar ao povo que existe em nossa história pessoas que foram importantes, pois nos defenderam e fizeram parta da nossa história...
Um grande abraço

Anônimo disse...

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Eduardo Marculino disse...

Parabens pela qualidade do BLOG.
abraços

Anônimo disse...

Meu pai também foi da Companhia de Obuses do 11 RI. Só não sei se ele foi no primeiro escalão ou foi no segundo escalão pra a Itália. Sei que ele era amigo do José Dequech que foi algumas vezes em nossa casa e nós na casa dele. Sempre nos recebeu bem. Por coincidência do destino, quando eu fui fazer engenharia florestal, pouco depois, o filho do José Dequech também fez o curso. Acabei de comprar o livro do J. Dequech e estou lendo. Muito bom, um dos melhores.
Eleutério Langowski

Regina Lemos Repórter disse...

Olá Fernanda.
Quero te dar os parabéns.Mas que ótimo trabalho , as publicações, a narrativa, tudo excelente , conteúdo nota mil.
Abraços
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